Governo teme nova derrota em lei florestal
Para Planalto, vai ser difícil reverter, no Senado, projeto que dá anistia a desmatadores e flexibiliza reservas. Governistas buscam indicar senador com laços ambientalistas como relator de projeto polêmico sobre matas
O governo prevê dificuldades para reverter, no Senado, os pontos polêmicos aprovados pela Câmara na reforma do Código Florestal.
Depois da derrota imposta por deputados da base, o Palácio do Planalto começou a agir para evitar a adesão de novos governistas nas bancadas aliadas no Senado.
A ressaca da derrota anteontem fez com que o Planalto mapeasse informalmente as condições no Senado. O governo também decidiu articular a indicação do senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) para relatar o código.
Novo Código beneficiará pequenos proprietários; ouça jurista
O jurista Luís Carlos Silva de Moraes garante que a reforma do Código Florestal, aprovada nesta terça-feira (24) pela Câmara dos Deputados, trará benefícios aos pequenos produtores.
Divulgação
Esta é primeira obra a enfocar infrações na esfera administrativa
Segundo o procurador, professor universitário e autor de "Código Florestal Comentado" e "Curso de Direito Ambiental", a mudança também é uma questão de segurança alimentar, de acordo com perspectivas pouco otimistas da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação) sobre a produção e o consumo de alimentos no mundo.
Em entrevista à Livraria da Folha, Moraes deu exemplos de como a questão era tratada e explicou a necessidade de mudança no texto. Na conversa, compara a renda de uma família de classe média urbana ao ganho financeiro de um latifundiário. Ouça.
Jornais estrangeiros criticam aprovação do Código Florestal
Da BBC Brasil
O jornal espanhol "El País" traz nesta quinta-feira uma reportagem sobre a mudança do Código Florestal, aprovada na Câmara dos Deputados um dia antes, com o título "Brasil outorga a impunidade aos desmatadores da Amazônia".
A reportagem, que adota um ponto de vista crítico à votação, ressalta que a medida é mais uma "vitória do setor rural sobre o ambiental" dentro da lógica política do país.
"Mais uma vez fica claro quem manda no Brasil quando os interesses dos latifundiários estão em jogo", escreve o correspondente do jornal no Rio.
"O todo poderoso setor agropecuário brasileiro mantém sob controle a Câmara dos Deputados através de uma densa rede de apoio nos partidos majoritários, incluindo o Partido dos Trabalhadores (PT), do governo. Mais do que nunca ficou claro o poder de pressão que o campo brasileiro continua tendo nos despachos de Brasília", ele afirma.
Para o correspondente do jornal, "as imagens do Congresso após a polêmica votação eram inquietantes: dezenas de deputados se abraçando eufóricos e fazendo o sinal de vitória".
"Na mesma manhã, o Brasil se despertava com a notícia do assassinato, a tiros, do líder ambientalista João Cláudio Ribeiro da Silva e sua esposa, ambos ativistas mortos pela preservação do Amazonas. Da Silva havia denunciado que sofria ameaças de morte por parte de madeireiros e pecuaristas do Pará, onde vivia. Os mesmos que provavelmente brindaram à aprovação do novo código."
JORNAIS CRITICAM
O relato do jornal espanhol ilustra o tom crítico adotado na maioria dos artigos veiculados na imprensa europeia e americana sobre o assunto.
No Reino Unido, o jornal "The Independent" titulou: "Corte e queima: Brasil rasga a lei que protege as suas florestas."
O periódico britânico dedica ao tema uma dobra de página e uma fotomontagem com imagens e gráficos, indicando que "a Amazônia segue ameaçada".
Como outras publicações, o "Independent" se debruça sobre os efeitos de uma possível concessão de anistia aos fazendeiros que, no passado, desmataram suas terras em maior escala que o permitido pela legislação.
A reportagem cita o renomado ambientalista Philip Fearnside, do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), ouvido pela agência de notícias Associated Press.
"A proposta de anistia dá continuidade a uma longa tradição brasileira, de legalizar o ilegal. As pessoas acham que podem desmatar ilegalmente porque mais cedo ou mais tarde serão perdoadas", diz Fearnside.
A mesma declaração é reproduzida também no espanhol "ABC", para quem os deputados "ignoraram as pressões dos ecologistas e passaram como um trator sobre a opinião pública".
A reportagem do diário de Sevilha descreve o código como "a gênese de um gigantesco ambiental", atribuindo a avaliação aos ambientalistas.
DESDOBRAMENTOS ECONÔMICOS
O tema também mereceu espaço em dois dos principais jornais econômicos da imprensa estrangeira, o americano "Wall Street Journal" e o britânico "Financial Times".
O diário nova-iorquino comenta que a mudança da lei é "uma vitória para os grandes produtores e pecuaristas do Brasil".
"A presidente brasileira, Dilma Rousseff, adotou uma plataforma pró-desenvolvimento e geralmente se alia com os produtores ao invés dos ambientalistas. Porém, membros de seu governo dizem que a legislação, aprovada na forma atual, vai muito longe", observa o "WSJ".
Já o "FT" ressaltou que a "legislação ambiental alimenta temores pela Amazônia".
O diário ventilou a visão dos ambientalistas de que as mudanças no Código Florestal podem ameaçar as exportações agropecuárias do país.
"Sob o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as autoridades conseguiram reduzir o ritmo de destruição da Amazônia através do monitoramento via satélite", escreve o jornal.
"Os ambientalistas argumentam que a implementação mais rigorosa da lei beneficiou os exportadores dos principais produtos brasileiros, incluindo soja e carne, que podiam alegar com credibilidade que não estavam produzindo em áreas desmatadas ilegalmente.
Entenda a polêmica sobre o novo Código Florestal
A Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do polêmico projeto do novo Código Florestal, proposto pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP).
A proposta, que já sofreu diversas modificações desde que foi apresentada pela primeira vez, dividiu ruralistas, ambientalistas e acadêmicos. Entenda a polêmica em torno do novo Código Florestal:
O QUE É O CÓDIGO FLORESTAL?
Criado em 1965, o Código Florestal regulamenta a exploração da terra no Brasil, baseado no fato de que ela é bem de interesse comum a toda a população.
Ele estabelece parâmetros e limites para preservar a vegetação nativa e determina o tipo de compensação que deve ser feito por setores que usem matérias-primas, como reflorestamento, assim como as penas para responsáveis por desmate e outros crimes ambientais relacionado. Sua elaboração durou mais de dois anos e foi feita por uma equipe de técnicos.
POR QUE ELE PRECISA SER ALTERADO?
Ambientalistas, ruralistas e cientistas concordam que ele precisa ser atualizado, tanto por ter de se adaptar à realidade brasileira, mas também porque ele foi modificado várias vezes por decreto e medidas provisórias e seria necessário algo mais sólido.
No entanto, os envolvidos divergiram em relação à urgência de votá-lo. A bancada ruralista queria aprová-lo rapidamente para pôr fim à "instabilidade jurídica", que dá margem a diversas interpretações em alguns pontos polêmicos. Os especialistas defendiam uma modernização, mas queriam adiar a votação para dar tempo a uma discussão mais ampla do projeto. Já a chamada bancada verde quer mudanças, porém diferentes das propostas de Rebelo.
O QUE SÃO AS APPS, UM DOS PRINCIPAIS PONTOS DE DISCÓRDIA?
As chamadas Áreas de Preservação Permamente (APPs) são os terrenos mais vulneráveis em propriedades particulares rurais ou urbanas. Como têm uma maior probabilidade de serem palco de deslizamento, erosão ou enchente, devem ser protegidas. É o caso das margens de rios e reservatórios, topos de morros, encostas em declive ou matas localizadas em leitos de rios e nascentes. A polêmica se dá porque o projeto de Rebelo flexibiliza a extensão e o uso dessas áreas, especialmente nas margens de rios já ocupadas.
QUAL A DIFERENÇA ENTRE APP E RESERVA LEGAL?
A Reserva Legal é o pedaço de terra dentro de cada propriedade rural --descontando a APP-- que deveria manter a vegetação original para garantir a biodiversidade da área, protegendo sua fauna e flora. Sua extensão varia de acordo com a região do país: 80% do tamanho da propriedade na Amazônia, 35% no Cerrado nos Estados da Amazônia Legal e 20% no restante do território. Os ambientalistas criticam a proposta do Novo Código que isentaria a recomposição da reserva legal para pequenos produtores.
POR QUE ELE CAUSA TANTA POLÊMICA?
Em junho de 2010, o deputado e relator Aldo Rebelo apresentou uma proposta com uma série de mudanças para alterá-lo. A aprovação final do novo Código emperrou justamente porque ele sofreu críticas de diversos setores políticos, de ambientalistas e de muitos acadêmicos.
A bancada ruralista, que defende boa parte das mudanças propostas originalmente, afirma que o Código Florestal em vigor atrapalha o desenvolvimento do país. Afirmam que ele foi criado em um momento em que a agricultura e a pecuária tinham baixa produtividade e que a alteração é necessária porque é preciso mais terra para ampliar a produção.
Sem as mudanças, dizem, não conseguirão suprir a crescente demanda de alimentos e o setor agropecuário brasileiro ficaria em desvantagem no cenário mundial.
Já os ambientalistas rebatem, afirmando que as terras já exploradas são suficientes para dobrar a produção, basta aprimorar a eficiência nas lavouras e nos pastos por meio de tecnologia e uso sustentável na agricultura e pecuária.
Organizações de defesa do meio ambiente - e boa parte da academia - afirmam que as mudanças no Código abrem brechas para aumentar o desmatamento e podem pôr em risco serviços ambientais básicos, como o ciclo das chuvas e dos ventos, a proteção do solo, a polinização, o controle natural de pragas, a biodiversidade, entre outros. Esse desequilíbrio prejudicaria até mesmo a produção agropecuária, que está diretamente ligada a tais fatores ambientais.
O QUE É UM MÓDULO FISCAL?
É uma unidade de medida determinada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que varia de acordo com o estado. Ele pode medir de 5 a 110 hectares. Em Brasília, por exemplo, um módulo fiscal equivale a 20 hectares, por exemplo, e no Acre a 378 hectares.
O QUE DEVE OCORRER APÓS A VOTAÇÃO NA CÂMARA?
No passo seguinte, o projeto aprovado segue para ser votado no Senado e, após aprovado, deve ser sancionado pela presidente Dilma Rousseff.
Fonte: Folha de São Paulo, 24, 25 e 26 de maio de 2011.
sexta-feira, 27 de maio de 2011
Atores repudiam mudanças no código florestal.
Os atores Christiane Torloni e Victor Fasano, historicamente envolvidos com questões ambientais, estiveram nesta terça-feira (24/05) na Câmara dos Deputados e manifestaram repúdio ao substitutivo que modifica o Código Florestal. Os atores são os responsáveis pela Campanha Amazônia para Sempre, que obteve em 2008 1,2 milhão de adesões na sociedade brasileira por meio de assinaturas ao documento, que também abordava os riscos de mudar a legislação ambiental.
Os artistas também tiveram uma reunião com a ex-senadora Marina Silva, discutindo os inúmeros impactos negativos do texto apresentado por Aldo Rebelo. “Estamos representando mais de um milhão de brasileiros que querem que as florestas sejam protegidas. Não é possível votar algo tão importante com essa pressa. É na urgência que mora o perigo”, analisou Christiane Torloni.
Victor Fasano também defende um aprofundamento das discussões. “Somos a favor de um texto bom para o país, em que todos cedam um pouco. Porém, o meio ambiente já cedeu muito, não pode perder mais”, disse.
A atriz classificou a situação dos debates sobre as mudanças como algo próximo do surreal, em que a discussão dos temas afetos à proteção das florestas foram colocados em segundo plano. “Essa situação não é inteligível. Quando há um cara do Partido Comunista [Aldo Rebelo] fechado com os latifundiários, tem alguma coisa errada. Dá a impressão que nós aprendemos tudo errado nas aulas de história”, criticou Christiane Torloni.
Os atores reportaram ter sofrido hostilidades nos corredores da Câmara dos Deputados, com insultos e agressões verbais por parte de representantes dos ruralistas. “Fomos atacados de forma autoritária. Também vimos há pouco nas galerias os deputados contrários às mudanças no Código Florestal serem vaiados por representantes do agronegócio. Isso não é democracia”, protestou.
O ator Victor Fasano, neto de produtores rurais, salientou que as correntes contrárias ao substitutivo não se opõem ao crescimento do setor agropecuário brasileiro. “O problema é tentar impor um texto como esse, que defende interesses de empresários do agronegócio que nunca pisaram na terra e que nunca sentiram o cheiro da terra”, afirmou.
Os artistas expressaram especial preocupação com três pontos do texto que está em tramitação: a anistia às multas para desmatadores, a diminuição de áreas de preservação permanente (APPs) e o enfraquecimento do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), órgão que permite o controle social nos processos de formulação de políticas públicas.
“Anistiar o desmatamento é premiar o desrespeito à lei. É como um policial de trânsito parar um motorista e, em lugar de multar, dar a ele os parabéns por ter se livrado de quilômetros de engarrafamento trafegando pelo acostamento”, concluiu Victor Fasano.
Por Bruno Taitson
fonte: wwf.com
Os artistas também tiveram uma reunião com a ex-senadora Marina Silva, discutindo os inúmeros impactos negativos do texto apresentado por Aldo Rebelo. “Estamos representando mais de um milhão de brasileiros que querem que as florestas sejam protegidas. Não é possível votar algo tão importante com essa pressa. É na urgência que mora o perigo”, analisou Christiane Torloni.
Victor Fasano também defende um aprofundamento das discussões. “Somos a favor de um texto bom para o país, em que todos cedam um pouco. Porém, o meio ambiente já cedeu muito, não pode perder mais”, disse.
A atriz classificou a situação dos debates sobre as mudanças como algo próximo do surreal, em que a discussão dos temas afetos à proteção das florestas foram colocados em segundo plano. “Essa situação não é inteligível. Quando há um cara do Partido Comunista [Aldo Rebelo] fechado com os latifundiários, tem alguma coisa errada. Dá a impressão que nós aprendemos tudo errado nas aulas de história”, criticou Christiane Torloni.
Os atores reportaram ter sofrido hostilidades nos corredores da Câmara dos Deputados, com insultos e agressões verbais por parte de representantes dos ruralistas. “Fomos atacados de forma autoritária. Também vimos há pouco nas galerias os deputados contrários às mudanças no Código Florestal serem vaiados por representantes do agronegócio. Isso não é democracia”, protestou.
O ator Victor Fasano, neto de produtores rurais, salientou que as correntes contrárias ao substitutivo não se opõem ao crescimento do setor agropecuário brasileiro. “O problema é tentar impor um texto como esse, que defende interesses de empresários do agronegócio que nunca pisaram na terra e que nunca sentiram o cheiro da terra”, afirmou.
Os artistas expressaram especial preocupação com três pontos do texto que está em tramitação: a anistia às multas para desmatadores, a diminuição de áreas de preservação permanente (APPs) e o enfraquecimento do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), órgão que permite o controle social nos processos de formulação de políticas públicas.
“Anistiar o desmatamento é premiar o desrespeito à lei. É como um policial de trânsito parar um motorista e, em lugar de multar, dar a ele os parabéns por ter se livrado de quilômetros de engarrafamento trafegando pelo acostamento”, concluiu Victor Fasano.
Por Bruno Taitson
fonte: wwf.com
Assinar:
Postagens (Atom)